Benefícios da normalização no reporte de resultados de prospecção e pesquisa de recursos geológicos

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No passado dia 21 de Novembro de 2018 Bruno Sameiro Pereira, sócio fundador e geólogo da Sinergeo, deu uma palestra intitulada “Benefícios da normalização no reporte de resultados de prospecção e pesquisa de recursos geológicos“. O conteúdo da palestra pode ser consultado e descarregado no presente artigo.

1. Agradecimentos

Exmº Sr. Presidente da ANIET,. restantes individualidades e representantes de associações e instituições presentes neste evento, Caros convidados, Srs. jornalistas, Minhas senhoras e meus senhores,

Boa tarde a todos.

É com grande regozijo que tenho a honra de participar neste evento, que é sem dúvida um marco em todo o sector. Não obstante o gosto com que venho a estas jornadas, que reitero, não consigo esconder o pesar com que tenho assistido ao evoluir da situação no sector, particularmente nos tempos recentes. A maledicência contra o sector tem recrudescido, o que tem servido para afastar investimento do País e cercear futuras oportunidades de desenvolvimento económico, em grande parte devido a pura e simples falta de conhecimento técnico e científico. Aliás, uma das consequências imediatas disto, é a rápida e acentuada descida de Portugal no Ranking de percepção de Risco de investimento.

Agradeço à ANIET a oportunidade de estar presente nestas jornadas, na pessoa da Eng. Francelina Pinto, a quem dirijo já em meu nome pessoal e da Sinergeo o nosso obrigado, bem como por extensão a toda a direcção. Espero, com esta intervenção dar um contributo, ainda que diminuto, para a melhoria de um sector fulcral da actividade económica, tantas vezes menorizado no nosso País. Irei iniciar a minha intervenção contextualizando a normalização em sentido mais lato e referindo alguns dos códigos de reporte de prospecção de recursos geológicos em uso no Mundo actualmente, passando de seguida para o contexto Nacional, em que tentarei traçar o quadro actual e as vantagens no estabelecimento de uma norma portuguesa de reporte de recursos geológicos, face à actual desregulação do sector, neste aspecto particular. Aliás, antecipando já o escopo da apresentação, o seu objectivo é contribuir para a elaboração de uma norma de reporte de recursos geológicos de carácter obrigatório, a ser utilizada tanto pelas entidades licenciadoras, como pelos operadores de prospecção e pesquisa de recursos geológicos. Acrescento que provavelmente não irei dizer nada de novo a muitos dos que assistem a estas jornadas. As minhas sinceras desculpas por isso.

ANIET
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2. Introdução

Ao olharmos para a actividade económica de toda a Sociedade contemporânea, mais concretamente desde os adventos da Revolução Industrial e da II Grande Guerra, verificamos que está regulada por normas e padrões que permitem que produtos, bens e serviços sejam produzidos e distribuídos com eficiência, correspondendo às legítimas expectativas dos consumidores.

A padronização e normalização induzidas pela necessidade de resposta ao consumo estão presentes em todas as nossas actividades diárias, sendo talvez o exemplo mais evidente o do vestuário e calçado. Seria no mínimo incómodo, ou até inimaginável, a não-existência de números padronizados para os sapatos que calçamos ou para a roupa que todos vestimos. Significaria uma enorme perda de tempo até encontrar um sapato que servisse, caso a Indústria Têxtil não se tivesse capacitado previamente com estudos biométricos, entre outros, que possibilitaram a padronização e normalização de produtos acabados e matérias-primas.

Por vezes, a padronização e normalização podem assumir contornos que talvez possam parecer exagerados e com demasiada ênfase no detalhe, como por exemplo no caso de algumas normas impostas pela União Europeia para os frutos e vegetais (em que são especificados, por vezes ad nauseam, o seu aspecto exterior, peso, dimensões etc.). Mas para que todos nos entendamos e para que a economia de bens e serviços transacionáveis funcione, é necessária a existência de normas. E de normas com carácter obrigatório.

É tão simples como isso: Lembremo-nos da norma, simples e eficaz utilizada nos semáforos, que consiste na elegante singeleza da combinação de cor e posição geométrica: verde em baixo para avançar, amarelo ao meio para ter cuidado e vermelho em cima para parar. Acho que todos sabemos o que acontece quando a norma não é cumprida. Irei voltar a ela adiante.

O estabelecimento de normas e padrões internacionais aplicados à prospecção e pesquisa de recursos geológicos, particularmente de recursos minerais, é também necessária, tendo sido uma preocupação tanto de Estados como das empresas operadoras, face à globalização da indústria mineira, alicerçada por uma maior importância de algumas matérias-primas minerais utilizadas em novas tecnologias, como o Litio, O Cobalto e as Terras raras, para citar apenas alguns exemplos.

Desde o início do Século XX que houve tentativas de desenvolvimento de sistemas, códigos ou normas que permitissem classificar em diferentes categorias os recursos e reservas mineiras, particularmente nos Estados Unidos.

Mas seria apenas no ano de 1976 que este esforço daria origem à síntese que hoje chamamos de quadro de classificação de McKelvey, que é a peça central da classificação de recursos e reservas mineiras.

3. Algumas normas utilizadas no mundo

Os esforços de criação de normas, códigos e linhas de actuação não se restringiram aos Estados Unidos, mas ocorreram em todo o Globo, com particular ênfase em países como a Austrália, África do Sul, Canadá e a Europa Ocidental no seu conjunto, com especial incidência no Reino Unido, que detêm uma fatia considerável do capital utilizado no financiamento de projectos de prospecção e pesquisa.

O facto de existirem distintas realidades geopolíticas, levou à necessidade de criação de diferentes normas ou códigos de reporte, utilizados para comunicar eficazmente os resultados de prospecção e pesquisa de recursos minerais. Ora, isso levou a que os distintos códigos ou normas de reporte reflectissem esses mesmos contextos, bem como as suas especificidades, o que levou à necessidade de criação de um organismo que tutelasse e superintendesse os diferentes códigos de reporte – neste caso a Comissão Internacional para o Reporte de Recursos e Reservas Mineiras – abreviadamente a CRIRSCO.

Podemos observar a distribuição e abrangência geográfica dos distintos códigos de reporte.

Se bem que parte desses códigos ou normas estejam especialmente pensados para reporte a possíveis investidores, ou ao mercado, o escopo de uma norma Portuguesa teria outro alcance, especialmente face à actual e crónica desregulamentação e/ou regulamentação ineficaz do sector, que contribui para a sua má imagem, conforme adiante se explanará.

Voltando ainda às normas vigentes actualmente, podemos observar que a Europa se encontra abrangida pelo Código Pan-Europeu para Reporte de resultados de Prospecção e Pesquisa, Recursos e Reservas Mineiras, abreviadamente o PERC. Por extensão, Portugal também deveria estar incluído, mas tal não sucede, ou se sucede não tem o cariz obrigatório que deveria ter por parte das entidades que tutelam o sector.

Os princípios basilares de aplicação que constituem qualquer Norma e que também se encontram patentes no PERC, e por extensão devem pautar também uma futura norma Portuguesa são: a Transparência, Materialidade, Competência e Imparcialidade. E o que é que está explicitado em cada um destes princípios?

A – Transparência: O princípio da transparência requer que a informação providenciada ao leitor que resolva consultar qualquer publicação feita sob o escopo da Norma de reporte seja suficiente, clara e sem ambiguidades, para que não haja espaço para enganos ou equívocos por parte de quem lê;

B – Materialidade: o princípio da materialidade impõe que o relatório contém informação relevante, à data de publicação, de modo a que possa ser feito um julgamento equilibrado acerca dos resultados de prospecção, recursos minerais e reservas mineiras reportadas;

C – Competência: requer que um relatório seja baseado no trabalho de técnicos devidamente qualificados e que estejam sujeitos a um código de ética profissional e de conduta vinculativos;

D – Imparcialidade: o princípio da imparcialidade, descrito no PERC, requer que o autor de um relatório técnico – entenda-se, relatório semestral de progresso ou outro entregue na DGEG – cujo conteúdo eventualmente possa vir a ser utilizado por terceiros, esteja satisfeito e capaz de declarar, sem qualquer reserva, que o conteúdo do relatório não sofreu influências indevidas da organização ou empresa em nome do qual o relatório é feito. O princípio da imparcialidade impõe também que exista clareza e que a mesma seja evidenciada de forma adequada, em aspectos como a existência de relações directas ou indirectas entre quem é responsável pela feitura do relatório e os donos ou promotores do projecto alvo de reporte. Desta forma, o leitor ou avaliador do conteúdo do relatório pode fazer um juízo balanceado do seu conteúdo.

A elaboração de uma norma portuguesa deverá obviamente ter em consideração a realidade nacional, particularmente na relação entre a entidade licenciadora e as empresas operadoras, bem com o contexto em que o sector se insere e a sua evolução previsível.

Aliás, caberia ao dono dos recursos – o Estado – representado actualmente na Direcção Geral de Energia e Geologia como entidade licenciadora, o fomento e a obrigação de utilização destas normas que, para além de permitirem a definição da riqueza do País de forma transparente e eficaz, no que a recursos minerais diz respeito, possibilitam também o estabelecimento políticas económicas racionais e consequentes a médio e longo prazo.

Conforme referido anteriormente, existe já um organismo – que pode ser traduzido como o “Comité Internacional para a Standardização no Reporte de Resultados de Prospecção Mineira” que estabelece o modelo transversal de reporte aceite à escala Global, pelo que a matriz em que tal norma a-haver se inseriria, já existe, o que constitui um alicerce sobre o qual algo pode e deve ser construído.

4. A situação em Portugal – Perplexidades

O nosso País tem uma larga tradição mineira, que nos chega desde os primórdios da Civilização. Essa tradição, antiquíssima, deixou-nos um legado de enorme valor que urge preservar e sobretudo dar a conhecer de forma organizada. Mais concretamente, de forma normalizada. O legado a que me refiro não é nada mais do que Conhecimento Gerado ao logo do Tempo Longo, com particular ênfase no conhecimento gerado a partir da Revolução Industrial, período em que a actividade de prospecção e exploração mineira se tornou sistemática.

Esse conhecimento, que resultou de muito esforço humano colectivo e entenda-se aqui este esforço na sua acepção mais vasta, sob os pontos de vista financeiro, físico e intelectual.

Ora, este conhecimento continuamente acrecionado, pode e deve ser um factor de alavancagem para a geração de ainda mais conhecimento. Concretizando: os dados geológico-mineiros de distintas proveniências, particularmente os resultantes de trabalhos realizados por empresas que sucessivamente desenvolveram actividades de prospecção e pesquisa, bem como trabalhos científicos e académicos de vária Natureza, podem e devem ser utilizados para fomento da actividade e para aumento de conhecimento científico, culminando, um dia, na descoberta de novos depósitos minerais passíveis de ser explorados. Tal já é em feito em parte, mas estará a ser feito de forma eficaz? Se não, quais os aspectos a melhorar? A informação existente está organizada e tratada de modo a poder ser inserida em sistemas normalizados de reporte e de qualificação de recursos e reservas mineiras, que permitam uma decisão informada, tanto por investidores como por entidades licenciadoras e por restantes partes interessadas, nomeadamente a população? Vejamos o enquadramento legislativo actual do sector.

Em Portugal, a Lei nº54/2015 estabelece as bases do regime jurídico da revelação e do aproveitamento dos recursos geológicos existentes no território nacional, incluindo os localizados no espaço marítimo nacional.

A mesma lei define na sua alínea o k) os «Depósitos minerais» como: quaisquer ocorrências minerais que, pela sua raridade, alto valor específico ou importância na aplicação em processos industriais das substâncias nelas contidas, se apresentam com especial interesse económico;

Ora, o especial interesse económico apenas é passível de ser comprovado e demonstrado perante terceiros, através do seu reporte de forma clara e perceptível, desde o início das actividades de prospecção e pesquisa, até ao estudo de viabilidade económica, cumprindo padrões universalmente aceites. Também dessa forma, é possível à entidade licenciadora, quando isso for justificado, fornecer informação relevantes a todas as partes interessadas nos projectos concretos, os chamados stakeholders, que vão desde as populações até organizações não-governamentais e grupos de pressão, particularmente de índole ambientalista. Chegados aqui, constata-se que paradoxalmente está já definida uma norma de relato financeiro de exploração e avaliação de recursos minerais – A Norma contabilística e de relato financeiro 16, que tanto quanto se saiba não é de carácter obrigatório nos relatórios de progresso das actividades de prospecção e pesquisa entregues á entidade licenciadora. Portanto, conclua-se: existe já uma Norma de relato financeiro para os recursos minerais, sem haver uma norma de relato para a prospecção e pesquisa propriamente dita!

Para além disso, a regulamentação do Dec-Lei 88/90, que julgo ainda se encontra em vigor, apenas impõe que seja demonstrada a idoneidade e capacidade técnica, não fazendo qualquer menção a quaisquer Normas de relato, claras e universais, a aplicar nos relatórios de actividade de prospecção e pesquisa, que são, tão-somente, os documentos em que se demonstram os investimentos feitos e trabalhos realizados no terreno. Tirando isto, permitam-me a pergunta, sobra o quê de importante na relação entre os operadores e a entidade licenciadora?

A regulamentação queda-se por termos gerais como: a entidade deve demonstrar idoneidade e capacidade técnica e financeira, mas de que forma é isso comprovado e acima de tudo acompanhado e auditado? Onde está isso explicitado? De que forma é garantida a equidade?

Existe a exigência de relatórios de acompanhamento, mas o que devem esses relatórios conter de forma explícita e com equidade para todos os operadores? Como é avaliada a qualidade da informação contida e a sua correspondência com a realidade factual? Como se avalia e se distingue a especulação infundada, de resultados factuais nesses relatórios? Pelo princípio do In dúbio pro reu? A sério?

Conforme mencionado anteriormente, existe já uma norma de relato financeiro, a norma 16. Ora, Porque não é esta norma, que já existe, exigida na componente financeira dos relatórios de progresso de actividades de prospecção e pesquisa? Como são os trabalhos efectivamente acompanhados e os investimentos comprovados?

Mais uma vez parece algo paradoxal, existir uma actividade licenciada pelo estado – a prospecção e pesquisa de recursos minerais- em que existe uma norma de relato financeiro, não existe uma norma de relato geológico e não há qualquer exigência formalizada e acima de tudo explicitada relativa aos relatórios de progresso entregues ao Estado. Voltando ao exemplo do semáforo que anteriormente mencionei, estamos aqui perante um grande sinal vermelho que contribui e muito para a actual degradação do sector e decorrente falta de sustentabilidade e dificuldade em fazer a sua defesa perante a sociedade.

O paradoxo aumenta quando vemos que desde 2013, sob os auspícios da Portaria n.º 62-A/2015 existe um núcleo o NFAT, Núcleo de Fiscalização e Acompanhamento Técnico, em cuja atribuições está precisamente e de forma muita clara o seguinte:

Propor normas e especificações técnicas relativas às atividades de prospeção, pesquisa e exploração de massas minerais;

Normalizar os procedimentos técnicos e administrativos de atribuição, transmissão e extinção de direitos relativos à prospeção, pesquisa e exploração de massas minerais;

Normalizar os programas de trabalhos e os relatórios técnicos relativos ao aproveitamento das massas minerais;

Porque não é o mesmo tipo de acção proposta e feita para os depósitos minerais? Sobretudo os depósitos minerais metálicos, muito mais sujeitos a especulação não fundamentada? Qual foi o critério que presidiu ao acima exposto?

ANIET
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5. Consequências negativas da não normalização

O sinal vermelho a que anteriormente me referi – entenda-se o sinal vermelho como a ausência de regulação explícita e especialmente de normalização de carácter obrigatório, por parte do dono dos recursos – O ESTADO, faz com que possa não existir, no limite, equidade entre os diferentes promotores de projectos de prospecção e pesquisa.

Para concretizar e para que o que foi anteriormente apresentado seja claro, irei focar-me agora no mais recente exemplo que foi, está a ser e será, que é o do recente interesse pelo Lítio.

O potencial nacional nesse metal tem vindo a ser referenciado desde há décadas, fruto da actividade de empresas de prospecção e exploração de matéria-prima cerâmica e de entidades do Sistema Científico Nacional, entre outros. Não obstante, essa informação, gerada em fontes distintas e em também diferentes períodos históricos é naturalmente heterogénea, pois não obedeceu a nenhuma norma de reporte, sendo também por isso de difícil inserção em Sistemas de classificação de reservas e recursos-padrão. O interesse no elemento Lítio era já algo que vinha a ser preconizado também desde há décadas, face ao aumento exponencial do uso de baterias para armazenamento e transporte de Energia-ou seja-daquilo que faz andar ao Mundo, se me permitem o coloquialismo.

Apesar de esta evolução estar prevista há décadas, foi necessário chegar ao ano de 2016, após alguma imprensa nacional ter dado eco e até amplificado o teor de algumas comunicações ao mercado feitas por empresas juniores, que se encontravam a realizar actividades de prospecção desse metal em Portugal, para que o poder político tivesse reacção. Sim, reacção ao invés de proacção.

O facto de a informação disponível não ter, na sua origem, obedecido a normas de reporte que facilitassem a sua compilação e permitissem objectividade, fez com que fosse necessário implementar um grupo de trabalho, cujo fruto da sua louvável e certamente exigente acção resultou num relatório cujo conteúdo é do domínio público. São facilmente perceptíveis as dificuldades de execução deste relatório, face à dispersão e natureza de informação disponível.

Isto é, aliás facilmente inteligível até na Resolução do Conselho de Ministros n.º 11/2018, baseada nas conclusões do dito relatório que nos diz no seu ponto 2.

  1. ii) O potencial geológico nacional, embora elevado, apresenta uma insuficiente caraterização das ocorrências em termos mineralógicos e de cálculo de recursos, mesmo ao nível inferior de «recursos inferidos», que importa clarificar, quer pelos serviços oficiais como pelas empresas;

Mais uma vez e com um exemplo concreto, o do Lítio, sai reforçada a necessidade de uma norma de reporte, que permita que quando necessário, a tarefa de avaliação do potencial geológico mineiro nacional seja feita de forma simples, correcta e transparente.

O avanço tecnológico dita que cada vez mais surja a necessidade de obtenção de matérias-primas até aqui pouco utilizadas. No caso das baterias, desde há já bastante tempo que se fala, por exemplo, do cobalto. Vai ser, perdoem-me a expressão, necessário assistir ao mesmo “filme” do Lítio no caso do cobalto? E quanto à restante tabela periódica?

E quando for dos metais como o Nióbio e tântalo e dos sempre eternos cobre e ouro? E os recursos geotérmicos, que serão peça-chave nas tão propaladas economia circular e transição energética? Refira-se que também nos recursos geotérmicos já existem normativos preparados, mas que carecem de transposição para normas portuguesas. Irá o país continuar a perder oportunidades devido à falta de comparência dos seus decisores?

6. Benefícios da normalização

A utilização de informação normalizada, proveniente da compilação e disponibilização de informação geológica-mineira histórica, e de trabalhos realizados por empresas e outras entidades, tais como o ex-Serviço de Fomento Mineiro, tornaria possível a criação de um verdadeiro Sistema de Informação georreferenciada e categorizada, facilmente perceptível pelas distintas partes interessadas num determinado Território, desde potenciais investidores à população, facilitando um processo de decisão previsível, informado e racional.

O conhecimento geológico de base já existe e o conhecimento científico dos diferentes sistemas minerais existentes no território Nacional, está em curso.

A implementação de uma norma de reporte de resultados de prospecção e pesquisa, de carácter obrigatório, permite também separar bons de maus projectos mineiros decorrentes de actividades de prospecção e pesquisa. Senão comparemos: os bons projectos são alicerçados em trabalhos técnico-científicos credíveis, passíveis de mensuração e auditoria, sendo também claros e escorreitos sob o ponto de vista administrativo. Os maus projectos normalmente estão escudados por nós jurídico-administrativos e não são passíveis de mensuração e auditorias cabais. São opacos e inibidores de prestação de contas – accountability- dos seus promotores. Obviamente que existem questões fundamentais como o Ordenamento do Território e o uso do Solo, mas também aqui, a montante de qualquer alteração de uso do solo, a existência de normalização associada ao conhecimento dos diferentes sistemas minerais, induziria e reforçaria a noção de alterabilidade do uso do solo, ou seja, a demarcação de áreas geográficas com uso do solo condicional, que seria alterado quando fosse provada a existência de um jazigo mineral, qualificado através de um sistema de classificação universal e explícito.

7. Conclusões e recomendações

A implementação de uma norma portuguesa de reporte de resultados de prospecção e pesquisa de recursos minerais, seria um contributo para a atracção e defesa de bons projectos de desenvolvimento mineiro alicerçados em conhecimento intensivo, a montante e a atracção de capital intensivo a jusante.

A transparência e sobretudo a previsibilidade, alavancadas pela existência dessa norma, tornariam o País bastante mais atractivo para investimento no sector, que, por muito que seja negado por alguns, continua a ser parte da espinha dorsal das actividades económicas nacionais. Por força de razão, a decisão política estaria facilitada, pois existiria sempre uma base sólida de quantificação da riqueza mineira do país, havendo desta forma uma clara assunção informada de responsabilidades por parte dos decisores e de todas as partes com papel no processo de decisão.

Deste modo, também a oposição a qualquer projecto mineiro teria de ser feita com pressupostos técnico-científicos rigorosos, ao invés da simples agitação e uso de sound bytes demagógicos, por alguns grupos, muitas vezes subsidiados por todos nós, os contribuintes.

A ausência de uma norma é um entrave ao desenvolvimento do sector, mas, tal como a escuridão da noite existe para que se possa apreciar o brilho das estrelas, também no tema em apreço, o legislador já previu a necessidade de normalização. Falta agora apenas explicitar, cumprir e fazer cumprir, em nome da transparência e do rigor inerentes à indústria extractiva, do progresso e da criação de riqueza nacionais, uma norma de reporte de resultados de prospecção e pesquisa universalmente aceite em sistemas de classificação internacionais.

Acabo com uma breve nota pessoal, se tal me é permitido. Apesar de tudo o que de nefasto foi feito ao sector, mesmo assim o País ainda consegue ter jazigos de Classe Mundial em Exploração e investimento em prospecção e pesquisa. Afinal há ou não há potencial? e temos ou não temos gente para dar a volta a isto?

(Bruno Sameiro Pereira)

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